Governo brasileiro promove rede de cooperação global para garantir integridade da informação sobre mudanças climáticas
Evento marca a primeira etapa de uma articulação internacional liderada pelo Brasil e prepara o tema para a COP 30

Banner do evento. Foto: Cristiane Parente
O “Capítulo Brasil” aconteceu no dia 26 de março, em Brasília, dando início às agendas da Iniciativa Global para Integridade da Informação sobre Mudanças no Clima, uma articulação internacional liderada pelo governo brasileiro com o intuito de promover a integridade da informação em assuntos climáticos. O evento reuniu representantes de diversas organizações da sociedade civil, pesquisadores e especialistas de todo o mundo, e organizou uma rede de cooperação de nível global para compreender os desafios, propor medidas e elaborar estratégias a fim de garantir a integridade das informações climáticas. Além de debater o cenário em âmbito nacional e mundial, o encontro buscou definir como o tema será pautado em novembro deste ano na 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 30), que será presidida pelo Brasil.
A Rede Nacional de Combate à Desinformação (RNCD, do Brasil) esteve presente e participou ativamente dos debates e deliberações formulados no encontro, representada na ocasião pela doutora em Comunicação, Cristiane Parente, membra da rede e diretora da Iandé Comunicação e Educação, que fez parte de duas das seis oficinas do evento: a do eixo 5 (Integridade da Informação) e a do eixo 6 (Educação Midiática).

Abertura do evento. Foto: Cristiane Parente
A Iniciativa Global nasceu da proposta brasileira apresentada na cúpula do G20, em novembro de 2024, elaborada a partir de um esforço conjunto da Secretaria de Comunicação da Presidência da República (SECOM/PR), do Ministério das Relações Exteriores (MRE), do Ministério do Meio Ambiente (MMA), da ONU (Organização das Nações Unidas) e da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). Até agora Chile, Dinamarca, França, Marrocos, Reino Unido e Suécia aderiram ao projeto.
Dois temas urgentes e amplamente debatidos a nível global se relacionam na articulação: a mudança climática e a discussão sobre as plataformas digitais, democracia e desinformação. João Brant, secretário de Políticas Digitais da SECOM/PR, assegurou que a COP 30 tratará esse tema com primeiro nível de relevância e apontou outros elementos-chave para que a iniciativa atinja seus objetivos. Segundo ele, a iniciativa precisa entregar resultados e, para isso, há um esforço de reunião e produção de evidências a fim de garantir ações concretas para a proteção dos direitos individuais e coletivos, contando com a parceria da Advocacia Geral da União (AGU) nesse empenho. Os outros dois elementos-chave apontados pelo secretário são comunicação estratégica – pensada em parceria com as redes e organizações envolvidas na iniciativa e que atuam na vanguarda deste tema – e ações concretas entre os países. Brant conta ainda que o Brasil já está propondo um conjunto de ações junto com a Dinamarca, e que a França também já está apresentando uma proposta.
Laudemar Aguiar Neto, embaixador e representante do Ministério das Relações Exteriores, afirmou que a Iniciativa Global é parte dos compromissos estabelecidos no Pacto Digital Global, no sentido de incentivar os órgãos das Nações Unidas, em colaboração com os governos e partes interessadas, a avaliar o impacto da desinformação nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). O embaixador declarou que uma das estratégias será promover financiamentos a pesquisas e ações envolvendo todas as organizações que atuam neste tema.
A Unesco é a organização responsável por construir e gerenciar o Fundo Global para a Integridade da Informação, com fins de alimentar essa produção de evidências. Adauto Soares, coordenador do Setor de Comunicação e Informação da Unesco Brasil, assegurou que o Fundo “financiará pesquisas confiáveis, compartilhamento de conhecimento e respostas estratégicas à desinformação, que vem negando o consenso científico em torno das mudanças climáticas e enfraquecendo políticas públicas baseadas em evidência sobre o meio ambiente”.
Ele afirma que o trabalho está ancorado em três pontos essenciais no âmbito internacional: conectar redes de pesquisa e jornalismo investigativo ao redor do mundo; criar uma estrutura estratégica para formuladores de políticas, mídia e educadores com maneiras de responder à desinformação sobre mudanças climáticas de forma eficaz; e campanhas de divulgação para neutralizar a desinformação e fortalecer a confiança pública nas comunicações relacionadas ao clima.
Além disso, o representante da Unesco garante que um elemento central da estratégia é apoiar jornalistas que cobrem crises ambientais, permitindo que conduzam e concluam suas investigações e se defendam contra-ataques legais. “Outro campo que estamos trabalhando é a Alfabetização Midiática e Informacional (AMI)”, destaca. Adauto também ressalta que, além da regulação estatal, são necessárias ações multissetoriais. “O livre acesso a dados para pesquisa, o empoderamento dos usuários e o fortalecimento de setores independentes e plurais de mídia são princípios essenciais à integridade da informação, já reconhecidos pelas Nações Unidas”, pontua.
O representante do Ministério do Meio Ambiente, Daniel Viegas, anunciou uma iniciativa de combate à desinformação a ser lançada nas próximas semanas, que consiste num painel para que o governo verifique, em tempo real, o que está sendo discutido nas redes sociais a fim de definir estratégias imediatas para combater as desinformações. O projeto foi elaborado em diálogo com o Instituto Democracia em Xeque e com a Universidade Federal do Espírito Santo, e, segundo Viegas, tem sido muito útil ao Ministério do Meio Ambiente, porque permite identificar os ataques e, a partir disso, repensar as estratégias de comunicação e atuar para reverter a desinformação, trazendo informações com embasamento científico.
Outra função da iniciativa, segundo Viegas, é estimular a informação e a divulgação científica: “Quando a gente está numa iniciativa de combater a desinformação em relação à mudança climática, a gente está querendo divulgar a pesquisa científica que o IPCC [Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas] tem consolidado. Mas uma coisa que angustia muito o Ministério do Meio Ambiente, e é uma cobrança, é que essa pesquisa científica precisa chegar nas pessoas que estão na vulnerabilidade climática, as pessoas que estão nas periferias, na zona rural, nas favelas, as crianças, os idosos”, aponta.
O evento contou também com a participação da ONU, representada por Charlotte Scaddan, conselheira sênior em integridade da informação na Organização, representando o debate em âmbito global. Scaddan declarou que, para a ONU, um dos objetivos desta iniciativa é tentar restabelecer o equilíbrio em termos de pesquisa (predominantemente na língua inglesa), e a melhor compreensão dos ambientes informacionais em todo o Sul Global, principalmente no que diz respeito às questões climáticas, pois só assim estaremos prontos para criar ações estratégicas.
Ela afirma ainda que estão iniciando na ONU uma pesquisa com foco na América Latina e puderam observar, até agora, que existem muitas similaridades nas táticas, narrativas e técnicas de desinformação usadas em outras temáticas e regiões do mundo. Segundo a conselheira, as narrativas mais comuns envolvem o suposto interesse político e econômico de pessoas ou organizações de esquerda na ciência e nas políticas climáticas, além de alegarem que os dados são alarmistas ou que a esquerda está controlando o tempo para controlar as pessoas.

Oficina do Eixo 5 sobre incentivos à integridade da informação. Foto: Cristiane Parente

Oficina do Eixo 6 sobre educação midiática, ambiental e sobre mudança do clima. Foto: Cristiane Parente